quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Kafka à beira-mar - Haruki Murakami

Sinopse

Kafka à Beira-Mar narra as aventuras (e desventuras) de duas estranhas personagens, cujas vidas, correndo lado a lado ao longo do romance, acabarão por revelar-se repletas de enigmas e carregadas de mistério. São elas Kafka Tamura, que foge de casa aos 15 anos, perseguido pela sombra da negra profecia que um dia lhe foi lançada pelo pai, e de Nakata, um homem já idoso que nunca recupera de um estranho acidente de que foi vítima quando jovem, que tem dedicado boa parte da sua vida a uma causa- procurar gatos desaparecidos.
Neste romance os gatos conversam com pessoas, do céu cai peixe, um chulo faz-se acompanhar de uma prostituta que cita Hegel e uma floresta abriga soldados que não sabem o que é envelhecer desde os dias da Segunda Guerra Mundial. Assiste-se, ainda, a uma morte brutal, só que tanto a identidade da vítima, como a do assassino, permanecerão um mistério.
Trata-se, no caso, de uma clássica (e extravagante) história de demanda e, simultaneamente, de uma arrojada exploração de tabus, só possível graças ao enorme talento de um dos maiores contadores de histórias do nosso tempo.


Críticas da Imprensa

"Um dos melhores romances de Murakami."
Newsweek

"Kafka à Beira-Mar é vivamente recomendado; leia-o ao seu gato."
Washington Post

"Um dos mais interessantes escritores do mundo."
Evening Satandard

"Como consegue Murakami criar poesia ao escrever sobre a vida contemporânea e as emoções? Estou ajoelhado de admiração."
The Independent

A minha opinião

Não posso estar mais de acordo com o The Independent relativamente à presente obra de Murakami: estou ajoelhada de admiração!
Que delícia ter descoberto este autor japonês, tão diferente de tudo o que já li, e que pena não o ter feito há mais tempo.
Neste livro assiste-se a um encadeamento de acontecimentos bizarros, vividos por pessoas misteriosas, às quais nos efeiçoamos à medida que as conhecemos.

Kafka Tamura é um rapaz de 15 anos que foge de casa e acaba por cumprir uma estranha profecia ditada pelo seu pai. Vem a conhecer Oshima, personagem muito interessante, que trabalha numa biblioteca e de quem se torna amigo. Saeki-san, a gerente da biblioteca, tem também uma história de vida muito misteriosa, que envolve a música "Kafka à beira-mar".
A biblioteca torna-se no local onde vive Kafka. Deste seu contacto caloroso com os livros, retirei dois excertos que me marcaram:

«Ao folheá-los, desprende-se das páginas de quase todos eles o perfume de um tempo passado - um perfume feito de saber e emoções que durante tempos infindos tem estado posto em sossego, a repousar no interior das capas.»

«Uma biblioteca deserta, de manhã - aí está uma coisa que mexe com a minha imaginação. Todas as palavras possíveis e imagináveis, todos os pensamentos do mundo descansam ali, tranquilamente (...) volta e meia interrompo a minha tarefa, deixo-me ficar a olhar para todos aqueles livros silenciosos (...).»

A alma de kafka tranformou-se num corvo negro na altura em que foi abandonado pela mãe e este corvo acompanha-o durante a sua vida. Como é referido no livro, Kafka viaja pelo reino das possibilidades, pelo que não estranha encontrar dois soldados numa floresta, desaparecidos na 2ª Guerra Mundial, e que não envelheceram.

O velhote Nakata é, quando a mim, a personagem com quem mais simpatizei. Foi atingido por um fenómeno inexplicável quando era criança e deixou de saber ler e raciocinar correctamente, além de ter um poder estranho de falar com gatos e de fazer chover pequenos animais, como sanguessugas. Há muitos momentos cómicos protagonizados por Nakata, nomeadamente com Hoshino, um camionista, que o vai acompanhar na sua missão de "abrir e fechar a entrada". Ambos vivem aventuras surreais.

As personagens do livro acabam por se cruzar, algumas indirectamente, e os acontecimentos, que vão tornando o livro viciante, desenrolam-se de uma forma inimaginável e surpreendente, como se alguns deles tivessem lugar num outro mundo mesmo aqui ao lado do nosso.

O mundo interior das personagens está muito bem caracterizado. Conseguimos "entrar" na cabeça de cada uma delas e perceber o que sentem, como vêem a realidade à sua volta e os acontecimentos.
A escrita invulgar de Haruki Murakami consegue ser simples e, ao mesmo tempo, complexa. Este autor é um mestre na linguagem poética e elegante.
Encontrei expressões como "tintim por tintim", "podes ir à tua vida", "estou metido numa salgalhada das antigas", "por a vista em cima", "ou vai ou racha" ou "dê lá por onde der" e achei muito curioso.
Parabéns também à tradutora, Maria João Lourenço, pelo excelente trabalho e pelas notas de rodapé, que revelam uma grande pesquisa e nos ajudam a perceber melhor alguns aspectos quotidianos e culturais do Japão que, sem essas informações, nos passaríam despercebidos.
No final, há assuntos que ficam por esclarecer, mas, pelo que já soube, isso é comum a Murakami. No meio de tantos elementos fantásticos e improváveis para o comum mortal, o leitor tira as suas próprias ilações.
Na estante, por ler, o Sputnik meu amor aguarda a minha disponibilidade para me enredar nas suas páginas, na certeza de que este Kafka à beira-mar é, para mim, uma obra-prima.

Excertos

«Por vezes o destino é como uma pequena tempestade de areia que não pára de mudar de direcão. Tu mudas de rumo, mas a tempestade de areia vai atrás de ti. Voltas a mudar de direcção, mas a tempestade persegue-te, seguindo no teu encalço. Isto acontece uma vez e outra e outra, como uma espécie de dança maldita com a morte ao amanhecer. Porquê? Porque esta tempestade não é uma coisa que tenha surgido do nada, sem nada que ver contigo. Esta tempestade és tu. Algo que está dentro de ti. Por isso, só te resta deixares-te levar, mergulhar na tempestade, fechando os olhos e tapando os ouvidos para não deixar entrar a areia e, passo a passo, atravessá-la de uma ponta à outra.»

«O amor é isso mesmo meu caro Kafka. Tu é que andas sempre nas nuvens e experimentas todos esses sentimentos maravilhosos, do mesmo modo que só tu é que desces ao abismo mais profundo da angústia. E o teu corpo e a tua alma têm de suportar. Estás entregue a ti próprio.»

«Quanto mais tempo as pessoas vivem, melhor aprendem a distinguir o que é importante do que não é.»

«O tempo continuou a passar, sem história.»

domingo, 27 de dezembro de 2009

O Recife - Nora Roberts

Sinopse

A arqueóloga marinha, Tate Beaumont, é apaixonada pela caça ao tesouro. Ao longo da vida, ela e o pai descobriram muitas riquezas fabulosas, mas há um tesouro que nunca conseguiram encontrar: a Maldição de Angelique - um amuleto com pedras preciosas, obscurecido pela lenda e manchado de sangue. Para encontrarem este artefacto precioso, os Beaumonts aceitam, hesitantemente, uma parceria com os mergulhadores Buck e Matthew Lassiter. Tate não fica feliz por partilhar o seu sonho, mas não tem alternativa. E, à medida que os Beaumonts e os Lassiters disponibilizam recursos para localizar a Maldição de Angelique, as águas das Caraíbas adensam-se com desilusões sombrias e ameaças escondidas. A parceria entre as famílias é posta em causa quando Matthew se recusa a partilhar informação - incluindo a verdade sobre a morte misteriosa do seu pai, alguns anos antes. E conforme Tate e Matthew avançam com a sua desconfortável aliança... o perigo e o desejo ameaçam emergir.

A minha opinião

Este foi o meu primeiro livro da Nora Roberts! Já conheço os seus livros e algumas fãs há uns anos, mas sempre pensei que não iria gostar deste tipo de histórias mais "leves". E como não há nada como experimentar, aproveitei esta fase em que me apetece uma leitura que não me obrigue a grande concentração e confesso que gostei bastante. E mais: quero repetir!
O Recife leva-nos às profundezas do mar azul celeste perto de uma pequena ilha nas Caraíbas. Acompanhamos não só as actividades de caçadores de tesouros oriundos de barcos naufragados em outros séculos, como também a atribulada história de amor de Matthew e Tate. Para dar suspense à história e fazer-nos torcer pelo lado do bem, temos ainda um vilão que quer a qualquer custo um amuleto - um colar que dizem possuir a Maldição de Angelique - que sabe estar no fundo do mar e é procurado pela equipa de Tate e Matthew.
Gostei da linguagem simples da escritora, que nos sabe prender à narrativa e querer saber sempre mais. Com a Nora passei umas boas horas de leitura neste Natal!
Recomendo!

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Marés de Inverno - Luís Miguel Raposo

Sinopse

« - A minha memória tem buracos que não consigo preencher - disse-me em tom triste. Quero recordar a nossa juventude, mas tudo parece desligado. Tu podias escrever acerca de nós, Vasco, sempre tiveste jeito para essas coisas.»

Deitado numa cama de hospital para morrer, Michael vai perdendo a clareza das memórias de rapaz, quando o seu mundo era apenas um grupo de amigos surfistas e a enorme paixão pelo mar que os mantinha unidos.
Vasco assiste ao crescente sofrimento do amigo, ao afastamento da mulher que ama, ao nascer de uma paixão emergente, à morte dos que mais estima, e aperta as rédeas do tempo para cumprir a sua promessa: escrever a história da sua juventude.

A minha opinião

Ofereci este livro ao meu namorado - também ele surfista pelas bandas da Costa da Caparica - que o leu e adorou. E foi no sentido de conhecer um pouco melhor este universo do surf que me aventurei pelas suas páginas. Devo dizer que não me arrependi.
Este é um livro triste, não só pela morte iminente de uma pessoa (que nos é dada a conhecer logo no início), como por várias outras tragédias, e por me fazer reflectir no tempo que passa e não volta. É a história de um grupo de amigos unidos pela paixão ao mar e ao surf. Mas não só. É também uma história dos primeiros amores, de angústias, de crescimento interior, de jovens tornados adultos, de passos mal dados na vida, de incertezas.
Sendo do Seixal, conheço os locais referidos no livro. Cresci com eles. E também eu me lembro de como era tudo, antes das construções e inovações que os tempos modernos impuseram.
O surf tem uma linguagem própria e tive necessidade de recorrer amiúde ao namorado e à net para entender determinados termos. Foi muito curioso aperceber-me de sensações, tão bem pormenorizadas, e gostei imenso da descrição, tão sensível e poética, dos sentimentos.
É um livro que recomendo pela riqueza e intensidade da escrita. Não é à toa que Luís Miguel Raposo é considerado Autor-Revelação de Língua Portuguesa.
Se quiserem saber um pouco mais, este autor tem um blogue:
http://mares-de-inverno.blogspot.com/
Aguardo com expectativa o seu novo romance!

Excertos

[A amizade]
«(...) o Bruno partilhou a minha prancha. O meu melhor amigo a partilhar o objecto mais fascinante que eu possuía. Eu achava que o mundo acabava no fim da nossa amizade

[A paixão pelo surf]
«(...) o vício do surf crescia-me no corpo como um defeito sem conserto.»

«Mais do que a razão que me levava a enfrentar um mar de se fugir, era eu a querer vencer-me. Esse é o verdadeiro teste do surfista. (...) Tudo o mais era nada comparado com a satisfação de vencer o que havia em mim. O meu corpo era adversário, um palco de medos da minha mente, e tudo em todas as coisas era eu a querer ser maior.»

[O primeiro amor]
«Eu olhava como se não houvesse mais e, que cada instante debaixo do sol, fascinava-me na melancolia, que era o desenho dos seus lábios, no entanto, porém, continuava a querer mais do que tudo ser a causa do sorriso que ainda não se fizera.»

«Fiz-me homem quando a vi sentada nas escadas de pedra porque é o amor que constrói homens dentro dos rapazes (...)»

«Há muitas formas de amar, mas só um amor.»

[A tristeza]
«Eu era a dor que me doía, amargurado na antecipação do que estava para vir, e nada mais existia.»

sábado, 19 de dezembro de 2009

A Cabana - Wm. Paul Young

Sinopse

E se Deus marcasse um encontro consigo?
As férias de Mackenzie Allen Philip com a família na floresta do estado de Oregon tornaram-se num pesadelo. Missy, a filha mais nova, foi raptada e, de acordo com as provas encontradas numa cabana abandonada, brutalmente assassinada.
Quatro anos mais tarde, Mack, mergulhado numa depressão da qual nunca recuperou, recebe um bilhete, aparentemente escrito por Deus, convidando-o a voltar à malograda cabana.
Ainda que confuso, Mack decide regressar à montanha e reviver todo aquele pesadelo. O que ele vai encontrar naquela cabana mudará o seu mundo para sempre.

A minha opinião

«- Se não foste capaz de cuidar de Missy, como posso confiar que cuides de mim?
(...)
- É por isso que estás aqui Mack (...) Quero curar a ferida que cresceu dentro de ti e entre nós. (...) quando não consegues ver para além da tua dor, possivelmente perdeste-me de vista, não é?»

Ao contrário do que a sinopse dá a entender, este é um livro caloroso, daqueles que aconchega o coração.
Missy foi raptada e assassinada aos 6 anos e a sua morte é identificada como a Grande Tristeza que se abateu sobre toda a família. A sua ausência criou um enorme vazio, o qual, quase 4 anos depois do incidente, ainda não foi ultrapassado.
A tragédia aumentou o abismo entre o relacionamento de Mack com Deus, embora ele não se tenha apercebido imediatamente desse crecente afastamento.
A velha cabana abandonada onde foram encontradas as provas do assassinato é o ícone da dor mais profunda de Mack e, quando este recebeu um bilhete de Deus convidado-o a ir até lá, acabou por ir, sem que a família soubesse, para tentar encontrar respostas.
Mack tinha muita raiva, muitas perguntas sem resposta e muitas acusações dolorosas a Deus, se é que Deus existia. Já na cabana encontra três personagens, duas mulheres e um homem, que personificam Deus, Jesus e o Espírito Santo.
A partir daqui a história deixa de ser tão dramática e, além da paz que transmite, tem situações muito informais com sentido de humor, que nos fazem sorrir.
Ao longo de um fim-de-semana, Mack é encaminhado para vários cenários - lago, jardim, caverna, penhascos - onde tem novas revelações que o vão levando progressivamente a alterar muitos pontos de vista relativamente aos seus "dados adquiridos" sobre Deus e a Criação.

Na primeira parte do livro, este prendeu a minha atenção e, depois de devidamente saboreadas, as páginas iam-se virando com muita curiosidade da minha parte em saber o que ia acontecer a seguir.
Mas depois deixou de ser um romance. As conversas com Deus assumiram, quanto a mim, a forma de uma aula teórica de moral, deixando completamente de lado o tom romanceado do livro que adorei inicialmente.
Relacionei algumas questões apresentadas com vivências minhas ou de outras pessoas que estão perto de mim e o livro fez-me reflectir sobre isso.
O livro mudou a minha vida conforme anunciado? Nem por sombras. Mas acredito que atenue a dor de alguém que perdeu um ente-querido e ainda não ultrapassou essa perda ou conforte pessoas que acreditem já não ter fé ou esperança.

Excertos

«A vida custa algum tempo e muitos relacionamentos.»

« (...) A maioria dos pássaros foi criada para voar. Para eles ficar no solo é uma limitação da sua capacidade de voar, e não o contrário. (...) Tu, por outro lado, foste criado para ser amado. Assim, para ti, viver como se não fosses amado é uma limitação, e não o contrário. (...) Viver sem ser amado é como cortar as asas de um pássaro e retirar-lhe a capacidade de voar. (...) a dor tem capacidade de cortar as nossas asas, impedindo-nos de voar (...) E, se essa situação persistir por muito tempo sem resolução, quase podes esquecer que foste criado para voar

«O ser transcende sempre a aparência, aquilo que só parece ser. Assim que começas a descobrir o ser que há por detrás de um rosto muito bonito ou muito feio, de acordo com os teus conceitos e preconceitos, as aparências superficiais apagam-se, até deixarem, simplesmente, de ter importância.»

«(...) por vezes os sonhos são importantes. Podem ser uma forma de abrir a janela para deixar que o ar poluído saia.»

«O pecado é o próprio castigo, uma vez que devora as pessoas por dentro.»

«A confiança é fruto de um relacionamento em que sabes que és amado. Como não sabes que te amo, não podes confiar em mim.»

« - (...) A imaginação é um talento poderoso! (...) No entanto, sem sabedoria, a imaginação é uma professora cruel. (...) achas que os seres humanos foram criados para viver no presente, no passado ou no futuro?
- (...) Acho que a resposta mais óbvia é que fomos criados para viver no presente. Estarei errado?
- (...) Tens toda a razão, por sinal. Mas agora diz-me onde passas a maior parte do tempo na tua imaginação: no presente, no passado ou no futuro?
(...)
- Devo admitir que passo muito pouco tempo no presente. Passo grande parte dele no passado, mas, na maioria das vezes, estou a tentar adivinhar o futuro.
- (...) É impossível ter poder sobre o futuro, porque ele não é real e nunca o será. Tentas fazer o papel de Deus imaginando que o mal que temes pode tornar-se realidade e, em seguida, tentas fazer planos e criar alternativas para evitares aquilo que temes

«A nossa Terra é como uma criança que cresceu sem pais, sem ter quem a guie e oriente (...) Houve quem tentasse ajudá-la, mas a maioria procurou simplesmente usá-la. Os seres humanos, que receberam a tarefa de guiar o mundo com amor, em vez disso, saquearam-no sem qualquer consideração para além das necessidades imediatas. E pensaram pouco nos próprios filhos, que vão herdar a sua falta de amor. Por isso usam e abusam da Terra e, quando ela estremece ou reage ofegante, ofendem-se e erguem os punhos contra Deus

«Muitos acreditam que é o amor que cresce, enquanto o amor simplesmente se expande para o conter. O amor é apenas a pele do conhecimento

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Wilt - Tom Sharpe

Sinopse

Romance cómico que conta as aventuras de Wilt, um professor de literatura que leva uma vida entediante e que tem um desejo secreto: matar a sua mulher obsessiva que faz tudo para o irritar.
Com Wilt, os leitores portugueses ficam a conhecer Tom Sharpe, o mais corrosivo e apreciado dos humoristas ingleses contemporâneos.
Livro surpreendente, completamente desconcertante, mas que “agarra” o leitor até ao fim, sem deixar qualquer hipótese de fuga.

Sobre o autor

Tom Sharpe nasceu em 1928, algures na Inglaterra. Estudou em Cambridge, fez a tropa nos Fuzileiros Navais (internacionalmente mais conhecidos por Marines, graças ao cinema e à televisão) e foi parar à África do Sul, em 1951. Lá, trabalhou no Departamento de Assuntos Não-Europeus. Depois, foi professor em Natal (cidade sul-africana). Chateado com a profissão, criou um estúdio de fotografia em Pietermaritzburgo (sempre na África do Sul), em 1957. E acabou por ser expulso por motivos políticos, em 1961. De volta a Inglaterra, leccionou História no Colégio de Artes e Tecnologia, de Cambridge.

A minha opinião

Fantástico. Para quem procura um romance muito divertido, descontraído, então, sugiro sem dúvida esta obra de humor britânico que, muitas vezes, me fez lembrar as famosas séries dos Monty Python ou até mesmo a sitcom Allo 'Allo!

Wilt é um professor de inglês de um Instituto de Letras e Tecnologia. As suas turmas são, particularmente, difíceis e chegam inclusive a levar outros professores à loucura e até ao suícidio.
Quando chega a casa é confrontado com uma esposa sui generis e muito difícil de aturar. Gorda, feia, dona de casa com a mania doentia da limpeza e da utilização do Harpic. Pobre Wilt.

E é neste cenário que Wilt começa a ter pensamentos negros em relação à sua mulher. É durante os passeios com o cão que vai maquinando a morte por acidente de Eva Wilt (sua esposa). E depois de um episódio bem divertido ocorrido numa festa de um casal muito liberal, decide pôr em prática aquilo que tem vindo a pensar, mas desta feita com uma boneca insuflável com vagina de nome Judy, que vai servir de cobaia para o exercício na perfeição (que de perfeito não tem nada) da futura morte por acidente da mulher Eva Wilt.

A partir daqui tudo de vai desenrolar. É acusado de assassinato e mantido durante uma semana em interrogatórios deixando a polícia completamente doida pensando que ele é o tipo mais frio e macabro que alguma vez conheceram.
Muito, mas mesmo muito divertido. Aconselho vivamente a quem procura desligar-se um pouco do stress ou até de uma leitura mais séria e pesada. É um antídoto perfeito e se são fãs do humor britânico, então tenho a certeza que não se vão arrepender.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

As velas ardem até ao fim - Sándor Márai

Sinopse

Um pequeno castelo de caça na Hungria, onde outrora se celebravam elegantes saraus e cujos salões decorados ao estilo francês se enchiam da música de Chopin, mudou radicalmente de aspecto. O esplendor de então já não existe, tudo anuncia o final de uma época. Dois homens, amigos inseparáveis na juventude, sentam-se a jantar depois de quarenta anos sem se verem. Um, passou muito tempo no Extremo Oriente, o outro, ao contrário, permaneceu na sua propriedade. Mas ambos viveram à espera deste momento, pois entre eles interpõe-se um segredo de uma força singular...

A minha opinião

«Dois velhos amigos, quando o sol já se pôs sobre eles, têm muitas recordações.»

Li este livro com imenso prazer. A escrita de Sándor é pura poesia, é encantadora e muito tranquila.
Trata-se de um livro de memórias, no qual é feita uma profunda reflexão sobre a amizade, mas também sobre a traição, a solidão, a tristeza, a morte, a mentira, a paixão, a velhice. No fundo é uma análise da natureza humana.
Henrik e Konrád conheceram-se quando tinham 10 anos, no colégio militar. Estudam juntos e vivem juntos durante vários anos. Mas, entretanto, algo acontece e, sem despedidas, perdem o contacto durante 41 anos.
Agora, ambos com 73 anos, reencontram-se num jantar - que recria o ambiente do seu último encontro - e, à luz de velas, o passado e os segredos são revelados através de um monólogo de Henrik.

Excertos

«Tudo perdura no tempo, mas torna-se tão pálido como aquelas fotografias muito antigas que ainda foram fixadas em chapas metálicas.»

«Uma pessoa sabe sempre a verdade, essa outra verdade que é oculta pelas representações, pelas máscaras e pelas circunstâncias da vida.»

«Os dois velhos observaram-se com aquela ponderação oscilante, com que só pessoas de idade percebem os fenómenos físicos: com muita atenção, examinando só o essencial, procurando no rosto e no comportamento os últimos sinais de vitalidade, os vestígios restantes da vontade de viver.»

«Aquilo que é importante, não esqueces nunca. Vim a saber isso apenas mais tarde quando comecei a envelhecer. Mas as coisas de pouca importância não existem, uma pessoa deita-as fora como os sonhos.»

«Essa pessoa que entregou a sua alma e o seu destino à solidão, não tem fé. Apenas espera. Espera aquele dia ou hora em que possa discutir mais uma vez, com a pessoa ou as pessoas que o levaram àquela situação, tudo o que o obrigou a aceitar a solidão. Prepara-se para tal momento (...) como se prepara para um duelo. (...) Porque existe um duelo na vida, sem espadas (...). E esse é o mais perigoso.»

«(...) só através dos pormenores podemos perceber o essencial, aprendi assim nos livros e na vida. É preciso conhecer todos os detalhes, porque nunca sabemos qual deles é importante, quando pode uma palavra iluminar um facto.»

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Por treze razões - Jay Asher

Sinopse

Naquele dia quando Clay regressou da escola, encontrou à porta de casa uma estranha encomenda com o seu nome escrito, mas sem remetente. Ao abri-la descobre que, dentro de uma caixa de sapatos, alguém colocara sete cassetes áudio, com os lados numerados de um a treze. Graças a um velho leitor de cassetes Clay prepara-se para ouvi-las quando é sobressaltado pela voz de Hannah Baker de dezasseis anos, que se suicidara recentemente e por quem ele estivera apaixonado. Na gravação, Hannah explica os seus treze motivos para pôr fim à vida, que a cada um deles correspondia uma pessoa e que todas elas iriam descobrir na gravação o seu contributo pessoal para aquele trágico desfecho.
O autor usa intencionalmente esta estratégia para criar uma grande intimidade entre Hannah e Clay (e o leitor) e conferir um grande realismo ao desespero e sofrimento daquela jovem, com notável intuição para captar os problemas e a vulnerabilidade na adolescência.

Críticas da Imprensa

«Um romance de estreia brilhante e fascinante de um novo a talentoso autor.» Kirkus Reviews

«Um ritmo alucinante e emocionalmente estonteante.» School Library Journal

«Os leitores não vão conseguir parar de ler...» Publishers Weekly

«Misterioso, belo e devastador.» The Chicago Tribune


Site

http://www.thirteenreasonswhy.com/


Blogue do autor

http://www.jayasher.blogspot.com/

Ler as primeiras páginas aqui.


A minha opinião

Antes de mais, a capa. Super apelativa, simples e linda. Foi o que me fez tentar saber mais sobre o livro quando este foi publicado há apenas algumas semanas.
A seguir a sinopse. Um tema com o qual, infelizmente, já lidei e que não consegui fazer nada para impedir. Tal como o Clay, de quem falarei de seguida.
Tinha que ler o livro. E, de facto, foi uma leitura compulsiva.
Hannah Baker, de 16 anos, suicidou-se e deixou várias cassetes gravadas com a sua voz, dirigidas às várias pessoas que estiveram na origem da sua decisão de desistir de viver.
A sua ideia era que as histórias que, através do efeito de bola de neve, a motivaram a suicidar-se, atropelem os "culpados", dando a conhecer a todos eles a verdade sobre as más acções cada um.
Boatos, fingimento, troça, intromissão na sua intimidade, superficialidade, traição, exposição ao ridículo, insensibilidade. Eis os motivos que levaram Hannah a sentir-se marginalizada, frustrada e enraivecida. A opinião dos outros, absolutamente fora do seu controlo, constituiu uma pressão demasiado grande sobre ela, que acabou por não conseguir ultrapassar esse obstáculo.
O leitor "ouve" todas as cassetes ao longo do livro através de uma só pessoa: Clay. Eles estavam apaixonados um pelo outro.
Clay ouve quase obsessivamente as cassetes, ao mesmo tempo que (re)visita os lugares nelas indicados (antes de morrer Hannah tinha deixado secretamente mapas com pontos assinalados aos destinatários). Ele quer desesperadamente compreender o que verdadeiramente aconteceu.
E pensa, atordoado, «estou a ouvir alguém a desistir da vida. Uma pessoa que conheci. Uma pessoa de quem gostei. Estou a ouvir. E, no entanto, é tarde de mais
O facto que nos depararmos, a todo o momento, com os movimentos e pensamentos de Clay e com as gravações, dá uma grande dinâmica ao livro, que decorre a um ritmo alucinante, e faz-nos querer saber sempre o que vem a seguir e quem é a pessoa que vem a seguir.
Este livro fez-me reflectir não só sobre o suicídio, mas também sobre a crueldade gratuita e implacável, que deixa marcas profundas nas pessoas e afecta muito negativamente a sua auto-estima. Concordo com a Hannah quando diz: «quando brincam com uma parte da vida de uma pessoa, estão a brincar com a vida dela toda. Tudo... afecta tudo

Outras expressões da Hannah:

«Queria que as pessoas confiassem em mim não obstante tudo o que tinham ouvido a meu respeito. E, acima de tudo, queria que elas me conhecessem. Que não se contentassem com a imagem que tinham de mim. Não, a pessoa que eu de facto era queria que eles fossem além dos boatos. Que fossem capazes de ver para além dos relacionamentos que eu já tivera, ou que talvez ainda tivesse e eles não aprovavam.»

«Ninguém pode ter a certeza do impacte que exerce na vida dos demais. A maior parte das vezes, nem nos passa pela cabeça. E, não obstante, não podemos evitar exercê-lo.»

«Se ouvimos uma canção que nos dá vontade de chorar, e já não nos apetece chorar mais, deixamos de ouvir essa canção. Mas não podemos fugir de nós próprios. Não podemos decidir que não nos queremos ver mais. Não podemos decidir desligar o ruído que nos ecoa na mente.»

Por último, apesar de ter encontrado este livro à venda no escaparate para livros juvenis, não creio que deva ser lido somente pelos jovens. Acho que é de leitura obrigatória para todos, com um especial conselho para os professores, que talvez tenham aqui uma ajuda para detectarem a tempo os eventuais "sinais" desta realidade.

domingo, 15 de novembro de 2009

A paixão de Jane Eyre - Charlotte Brontë

Sinopse

"A Paixão de Jane Eyre" é a história de uma órfã que vive com a sua desagrádavel tia e os seus nada atractivos primos. Mais tarde, colocada num asilo, Jane começa a desenvolver um espírito independente para a época e aprende que a melhor maneira de conservar o respeito próprio na adversidade é manter o autocontrole. Esta aprendizagem servir-lhe-á para toda a vida e permitir-lhe-á repudiar noivos, ser auto-suficiente, mudar de identidade e encontrar um ser em igual nível intelectual e da paixão sexual.

A minha opinião

O livro tem início com uma história muito parecida com a da "Cinderela": Jane, uma miúda de 10 anos, orfã, vive com a sua tia Mrs. Reed, primos e criadas. O seu pai era irmão do marido de Mrs. Reed e, no seu leito de morte, fez a sua esposa prometer que cuidaria da pequena Jane. Mas tal não acontece e Jane sofre constantemente de maus tratos por parte da tia e dos seus três filhos.
Mrs. Reed envia então a sobrinha para um colégio de raparigas orfãs, onde Jane, embora passe privações a nível alimentar e de conforto, conhece o carinho de algumas pessoas, principalmente Miss Temple (a directora) e Helen Burns.
Helen morre de tifo, mas ainda tem tempo para lhe ensinar valores como a coragem, a fé, o autocontrole. Diz-lhe um dia: «é fraqueza e disparate dizer que não se pode suportar o que o destino nos impõe».
Esta frase, quanto a mim, resume a ideia que este livro transmite.
Aos 18 anos, Jane sai desse colégio e ruma a Thornfield, onde passa a ser perceptora de Adéle, filha ilegítima de Mr. Rochester. Neste ponto da narrativa, lembro-me do filme "Música no Coração": Jane e o seu patrão apaixonam-se um pelo outro, a ponto deste a pedir em casamento. Contudo, no dia da boda, descobre-se que o noivo afinal era casado e escondia a mulher, uma louca de poucos princípios e escrúpulos, na mansão.
Jane foge, passa por um mau bocado e vem a ser acolhida por uma família - a sua - com a qual vive durante um ano, sendo, nos primeiros tempos, professora. Herda muito dinheiro de um tio que vivia na ilha da Madeira e divide a herança com as suas primas e primo. Este último acaba por pedi-la em casamento.
No entanto, a voz do destino chama-a e Jane parte à procura do seu amor. Encontra Mr. Rochester viúvo, na miséria, cego e mutilado devido a um incêndio. A sua mulher havia posto fogo na mansão, incidente que acabou por lhe ser fatal a ela.
E, no final, após tantas contrariedades, ambos casam e vivem felizes para sempre.
Uma história muito bonita sobre um amor intenso, passada no século XIX, já adaptada ao cinema e séries de TV. Levou algum tempo a ler pois, por diversas vezes, me cansei um pouco com as descrições que tornam o livro tão denso. Mas, trata-se de um livro muito interessante e que teve muitos pontos altos na sua leitura. Dele retirei que, por muito que achemos que não, se pode sempre suportar o que o destino nos impõe.

sábado, 7 de novembro de 2009

Os Ficheiros Spellman - Lisa Lutz

Sinopse

Bem-vindo ao mundo da família Spellman. Eles são divertidos, muito unidos, calorosos e extremamente competentes e dedicados ao seu trabalho. Bom, talvez um bocadinho dedicados de mais… Donos de uma agência de investigação privada que emprega quase todos os membros da família, desenterrar os segredos das vidas alheias é a coisa mais natural no seu dia-a-dia. O pior é quando já não conseguem separar o trabalho da vida pessoal…Os Ficheiros Spellman é ao mesmo tempo uma comédia hilariante e enternecedora e um manual sobre como levar a família à loucura… tudo por amor.

Sobre a autora

Com 21 anos, Lisa Lutz escreveu o seu primeiro argumento de cinema. Depois de 10 anos a trabalhar no filme Plan B, decidiu que afinal não queria ser guionista. Rapidamente encontrou outras formas de trabalho, entre as quais a aventura de integrar uma empresa de investigação privada, mote para criar, em 2007, o seu primeiro trabalho de ficção. E assim ao beber a experiência da vida real, a autora lançou-se no mundo das investigações criando a família Spellman. Divertida e muito surreal, o seu núcleo é composto pela mãe Olivia, o pai Albert e os filhos Izzy, David e Rae. Uma família unida pelo mesmo objectivo: invadir a privacidade dos outros. O pior é quando o feitiço se vira contra o feiticeiro e se dá início a uma investigação dentro de casa. Todos se vigiam uns aos outros, há escutas pelos corredores, um tio está constantemente a desaparecer e para complicar mais a situação, a irmã mais nova, Rae é raptada. Um relato que mescla suspense com humor no segundo volume da colecção «Lado B», da Presença.

Os Ficheiros Spellman é o primeiro livro de Lisa Lutz e foi considerado um acontecimento editorial, tendo rapidamente sido adquirido por 22 países.

Críticas de imprensa

«Uma estreia divertida e espirituosa, com humor e caos, descontraída e ligeira. Uma história fresca que aborda problemas reais de uma forma nada convencional.»
Kirkus

«Deslindar um caso pode ser muito complicado e até algo excêntrico quando toda uma família de detectives está envolvida, mas Lutz fá-lo com grande humor nesta estreia magnífica.»
Publisher’s Weekly

«Quando um livro destes cai no colo de um crítico literário, é como se fosse Natal. Posso ler? E ficar com o livro? E isto é o meu trabalho?...Lisa Lutz conseguiu uma coisa rara: um romance de estreia que não é apenas refrescante (tantos o são), mas também divertido. Divertido sem ser banal. Inteligente sem ser pretencioso.»
Bookreporter

A minha opinião

Gostei da sinopse. Não conhecia a autora e não tinha qualquer opinião acerca do livro. Mas como na altura procurava uma leitura descontraída decidi arriscar.

E arrisquei muito bem. O começo do romance leva-nos a um ambiente carregado de suspense, uma perseguição feroz pelas ruas de São Francisco. Pensamos que será uma fuga pela vida, alguém em perigo tentando escapar às garras dos maus da fita quando, por fim, chegamos ao final de todo este aparato e verificamos que quem foge é Izzy e quem persegue são os seus pais Olivia e Albert Spellman…

E é assim esta louca família. Mestres de investigação privada, os Spellman investigam tudo e todos, especialmente os membros da própria família e mais grave do que isso, fazem chantagem uns com os outros. Senão vejam: a filha mais nova de 14 anos (Rae Spellman) tem um álbum com fotos comprometedoras de todos os membros da família e fazendo chantagem com os mesmos consegue desta forma extorquir-lhes dinheiro. Até podiamos achar isto como um crime muito grave, mas a forma como a autora escreve e o ambiente divertido como consegue conduzir a narrativa leva-nos a adorar cada um dos Spellman e com eles dar umas boas gargalhadas.

Confesso que fiquei fã do tio Ray, irmão de Albert Spellman, viciado em jogo, alcoólico invertebrado e frequentador assíduo de bordéis. E como o compreendo, depois de ter levado uma vida de princípios morais, rigorosa dieta e desporto frequente é-lhe diagnosticado um cancro em fase terminal.
Quando já ninguém esperava, Ray recupera e entrega-se a partir desse momento a uma vida boémia. Quando inquirido sobre a mudança radical de hábitos “respondeu que a única coisa que tinha ganho com a sua anterior vida certinha for a um cancro e que não estava para passar por isso outra vez.”

Enfim, gostei muito deste livro, com muito humor, loucura à mistura, os Spellman procuram as formas mais hilariantes e divertidas de mostrar como amam e se preocupam com os demais elementos da família.

Related Posts with Thumbnails